12
Nov08
INFLAMAÇÃO E REDENÇÃO
vozeslivresmacao
Queridos Ti Ermelinda e Ti Abílio, meus ilustres vizinhos cardiguenses ( quase me apetecia dizer, já, meus queridos segundos paizinhos, desde os meus cinco aninhos ) espero que se encontrem de óptima saúde ao receberem esta minha carta aberta carregada de tantas saudades do passado, mas, também, e, sobretudo, com um orgulho do tamanho do mundo em que vivemos e, no qual, temos o privilégio de ainda vos ter connosco, peito aberto para o sol que todos os dias continua a nascer para vós nesse sagrado Quintal da Estrada. Hoje, Ti Ermelinda, o pretexto são mesmo os 90 anos do Ti Abílio e, permitam-me, desde já, em meu nome e no da minha família ( e, claro, no dos meus queridos e saudosos Pais, vivendo, já, no Céu a que tiveram direito, não duvido!) deixar aqui, publicamente, os parabéns mais gostosos dos últimos tempos. De facto, hoje, mais do que nunca, é para vós, com inteiro mérito a expressão com que saúdo os aniversariantes amigos: O que os anos nos fazem quando fazemos anos!
Pergunto-me, às vezes, porque permaneço fiel a estas terras sendo que não sou de Cardigos, não sou de Mação, e, no entanto, é para aqui que me dirijo, há séculos, todos os fins-de-semana, aqui conheci a minha querida Maria Filomena, aqui tive os meus filhos João e Rita, aqui recuperámos a casa do Bisavô Luís, aqui recuperámos o abandonado Vale das Árvores, aqui recuperámos, recentemente, o que restava de uma velha casa, convertida em despudorado urinol e desordenado parque de estacionamento, aqui, em suma, investimos as nossas economias, apresentando, agora, contra ventos e marés, um refrescante jardim, assim, alindando, com o esforço do nosso suor, uma significativa parte deste Centro Histórico de Mação em progressiva ruína.
Sim, não tenho dúvidas, queridos amigos, esta desinteressada paixão pela terra a que chamo, de há muito, a minha, tem a sua origem, também, no consagrado exemplo de dedicação à vida e ao incansável amor pela natureza que, em vós, afortunadamente bebi. É tão bom, tão consolador ter ouvido o Ti Abílio, no dia 10 de Outubro, dia dos seus 90, dizer-me, ao telefone, “Vá lá, Tózé, quando é que cá vens, já temos muitas saudades tuas!....”
É nessa certeza que certifico a minha opção em querer terminar os meus dias por aqui, “Perto do Princípio”. Muito obrigado pela vossa amizade e quero-os por cá muito mais tempo. Até porque andam aqui uns meninos que se julgam muito importantes, que tardam em perceber o verdadeiro sentido da importância da Vida ( não tiveram o privilégio de vos conhecer, como eu, pois não estavam cá ou, se estavam, sempre acharam que nunca teriam nada a aprender com ninguém, muito menos a arraia miúda de que somos feitos ) a querer fazer-me mal só porque a gente sempre quis a nossa terra mais bonita, ao contrário deles, que, agora, despudoradamente, e contra todas as regras da ética, querem vendê-la ao desbarato nas mil e uma lojas de duvidosa conveniência. Mação, Ti Abílio e Ti Ermelinda, no que à honra diz respeito, padece, neste momento, de uma grande inflamação. Só o vosso exemplo de vida nos pode ajudar a curá-la. Só vós, queridos amigos, sois a nossa redenção.
António Colaço